Sobre o Movimento Popular INCLUA-SE

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São Caetano do Sul, Região do ABCD /São Paulo, Brazil
Não sabemos o que somos e sim o que NÃO somos! Não somos uma organização não governamental sem fins e muito menos com fins lucrativos (ONGs); Não somos um INSTITUTO; Não somos uma INSTITUIÇÃO nem pertencemos a uma; Não somos de CONSELHOS nem representamos segmentos. Não defendemos bandeiras PARTIDÁRIAS. Sendo assim, somos ILEGÍTIMOS aos olhos dos Poderes Constituídos!

*Pisos Inadequados - Cartilha de acessibilidade nas calçadas.


Postado em 29.04. 2011


Continuando com a postagem anterior, onde expusemos algumas barreiras de ordem programática e barreiras urbanísticas (ambas derivadas da barreira atitudinal), tais como os mobiliários urbanos sobre o passeio público, obstruções estas que dificultam o livre caminhar  principalmente das pessoas com deficiência visual, iremos, agora, falar sobre o piso no passeio adotado como sendo o ideal para as áreas de passeio nas calçadas executadas pela prefeitura de São Paulo e por tantos outros municípios que seguem este “padrão”:


O bloco intertravado.



  Desenho padrão para calçadas de orgãos públicos. 
Fonte: cartilha Passeio Livre.


Como já fora dito neste “singelo” blog, segundo a norma técnica NBR 9050-04:


Os pisos devem ter superfície regular, firme, estável e antiderrapante sob qualquer condição, que não provoque trepidação em dispositivos com rodas (cadeiras de rodas ou carrinhos de bebê)...


No Decreto 45.904 de 2005, que trata da padronização dos passeios públicos do município de São Paulo, com foco na acessibilidade e que é referência para demais municípios, em seu art 9º, Inciso I, as características citadas no parágrafo acima também estão explicitadas; porém, na cartilha intitulada Passeio Livre (síntese do decreto), observamos o emprego de pisos que possuem superfícies instáveis, irregulares e trepidantes e é sabido que a prefeitura de São Paulo adotou os blocos intertravados como padrão para as calçadas  por ela executadas (as calçadas do entorno de edifícios públicos e das vias estruturais definidas no plano diretor do município): foram 500 quilômetros lineares de calçamento entre 2005 e 2008 feitos, em sua maioria, com blocos intertravados! Foram investidos cerca de 55 milhões de reais dos cofres municipais.


O discurso "ecologicamente correto" para o emprego deste piso no calçamento, que é 40% mais caro e exige manutenção constante e mão-de-obra "mega" especializada, fora: 

é necessário permeabilizar o solo para combater as enchentes!  

Pois é, na visão linear dos nobres políticos cabe às diminutas calçadas, sobras do viário, o dever de contribuir para a erradicação das enchentes! Ideia esta vendida pela Associação Brasileira de Cimento Portland (ABCP). O curioso é que na hora de alterar planos diretores à revelia para atender interesses econômicos de certos setores, os nobres “edis” e “alcaides” não pensam nas enchentes.

Mas e na acessibilidade, alguém pensou? Afinal, o papel primordial das calçadas é o de ter áreas de passeios que  promovam a livre circulação (com segurança, conforto, autonomia e fluidez), de TODAS as pessoas: é o que está explicitado na cartilha Passeio Livre!  


Rua Visconde de Inhaúma - São Caetando do Sul


Caros(as) leitores(as) - sim, temos leitores(as), para o desespero de alguns -, blocos intertravados, assim como o piso hidráulico de alto relevo e  o concreto estampado, causam trepidação em dispositivos com rodas (Leia sobre)! Eu, Tuca, circulei fazendo uso de uma cadeira de rodas por calçadas executadas com estes pisos e senti muita dificuldade para me locomover, fiquei exausta, bolhas nos dedos, dores nas articulações dos punhos e ombros. Na Reatech 2010, perguntei para várias pessoas sobre estes pisos (pessoas usuárias de cadeira de rodas não motorizadas) - dentre elas pessoas que praticam esportes, portanto, com excelente condicionamento  físico - e foram unânimes: 

são horríveis!


E por que a comissão formada em 2004 por sete Secretarias * e mais de trinta entidades que revisaram e elaboraram a cartilha Passeio Livre, como o CREA-SP (Conselho de Engenharia e Arquitetura **) e a  CPA (Comissão Permanente de Acessibilidade) escolheram pisos cujas características não seguem o que está recomendado na norma técnica NBR 9050-04 e, consequentemente, no  Decreto Federal 5.296-04 , impossibilitando, assim, um caminhar seguro e confortável a TODOS os pedestres?


Será que os interesses de mercado de grupos econômicos se sobrepuseram aos interesses do coletivo (sociedade que deve ser inclusiva), da mesma forma que os interesses do privado no que diz respeito a faixa de acesso nas calçadas?


Será que  a lei 14.675 de 2008 - Plano Emergencial de Calçadas (PEC) - de autoria da  ex-secretária e ex-vereadora Mara Gabrilli  surgiu para erradicar estas barreiras programáticas ( pisos inadequados e faixa de acesso) contidas no Decreto Municipal intitulado Passeio Livre? 

Neste link vocês encontarão um breve histórico  
do Decreto Municipal Passeio Livre. 



* A Secretaria da Pessoa com Deficiência e Mobilidade Reduzida - e que tinha como titular da pasta a hoje Deputada Mara Gabrilli - foi criada em abril de 2005, um mês antes do lançamento do Decreto Municipal, de maio do mesmo ano. Assim, não sabemos se a secretária participou da elaboração do mesmo. Perguntei via twitter a deputada Mara sobre sua participação, mas não obtive retorno. No site da prefeitura, apenas encontrei uma citação da ex-secretária sobre o Decreto:

"Esse é um movimento de transformação social, que diz respeito a toda a população de São Paulo,", avaliou Mara Cristina Gabrilli, secretária muncipal da Pessoa com Deficiência e Mobilidade Reduzida. Para ela, que revelou uma enorme paixão em passear pelas calçadas da cidade, a padronização do passeio público "fará uma grande diferença na vida das pessoas".

** Os arquitetos se emanciparam! Agora possuem conselho próprio: CAUS - Conselho de Arquitetura e Urbanismo.


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Próxima postagem - Vamos ampliar nosso olhar sobre o Plano Emergencial de Calçadas.      


Movimento: consequência

 Postado em 12.04.2011

Por Amilcar Zanelatto


Na minha postagem anterior (Bom Conselho) discorri sobre o Conselho Municipal da Pessoa Portadora (sic) de Deficiência de São Caetano do Sul e critiquei a forma antidemocrática com a qual a Prefeitura conduziu o processo de sua formação. 

Fui ao Ministério Público e denunciei à Promotoria tal processo, que acabou resultando em um processo: o Ministério Público também entendeu que direitos de cidadania, garantidos pela Constituição, foram lesados.

Para acompanhamento de todo(a)s, uma consequência da ação, do Movimento, está na abertura de inquérito civil público, abaixo descrito.

A causa desse Movimento remonta a sete anos atrás e oportunamente publicarei texto, contando.

Amilcar Zanelatto Fernandes




PORTARIA DE INSTAURAÇÃO DO INQUÉRITO CIVIL n.º 347 / 2011
Promotoria de Justiça de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência


Considerando que ao Ministério Público, nos moldes do art. 127, da Constituição Federal e art. 91, da Constituição do Estado de São Paulo, cabe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos direitos sociais e individuais indisponíveis;

Considerando que, conforme art. 129, inciso III, da Constituição Federal, ao Ministério Público, através de inquérito civil e ação civil pública, cabe a proteção dos interesses difusos e coletivos, nele incluídos os das pessoas com deficiência;

Considerando que a República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito (art. 1.˚, da Constituição Federal);

Considerando que “a democracia que o Estado Democrático de Direito realiza há de ser um processo de convivência social numa sociedade livre, justa e solidária (art. 3.˚, I) , em que o poder emana do povo, e deve ser exercido em proveito do povo, diretamente ou por representantes eleitos (art. 1.˚, parágrafo único); participativa, porque envolve a participação crescente do povo no processo decisório e na formação dos atos de governo; pluralista, porque respeita a pluralidade de ideais, culturas e etnias e pressupõe assim o diálogo entre opiniões e pensamentos divergentes e a possibilidade de convivência de formas de organização e interesses diferentes da sociedade; há de ser um processo de liberação da pessoa humana das formas de opressão que não depende apenas do reconhecimento formal de certos direitos individuais, políticos e sociais, mas especialmente na vigência de condições econômicas suscetíveis de favorecer o seu pleno exercício”

Considerando que a Constituição Federal consagra o regime democrático permitindo a participação popular também na condução das questões públicas tanto na administração direta quanto na indireta, (art. 37, XXII e § 3.˚ e arts. 194, inciso VII e 198, inciso III);

Considerando que essa participação popular vem também projetada na existência dos CONSELHOS como instâncias de deliberações das políticas públicas federais, estaduais, municipais ou distrital;

Considerando que a Convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, ratificada pelo Brasil por meio do Decreto Legislativo n.˚ 186/2008 e pelo Decreto Presidencial n.˚ 6.949/09, que por força do art. 5.˚, § 3.˚, da Constituição Federal, tem status de emenda constitucional, prevê o direito da pessoa com deficiência de participação efetiva e plena na condução das questões públicas, sem discriminação e em igualdade de oportunidades com as demais pessoas (art. 29);

Considerando que no âmbito federal foi criado o Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência - CONADE -, com a incumbência, dentre outras, de zelar pela efetiva implantação da Política Nacional para Integração da Pessoa com Deficiência, sendo órgão constituído, partidariamente, por representantes de instituições governamentais e da sociedade civil (arts. 11 e 12, do Decreto Federal n.˚ 3.298/99);

Considerando, ainda, que outras instâncias deliberativas poderiam ser criadas pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos municípios, integrando sistema descentralizado de defesa dos direitos da pessoa com deficiência (art. 13, do Decreto Federal n.˚ 3.298/99);

Considerando que no âmbito do Estado de São Paulo foi criado o Conselho Estadual para Assuntos da Pessoa com Deficiência (Decreto-lei Estadual n.˚ 40.495/95 e Decreto-lei Estadual n.˚ 44.723/00, arts. 4.˚, VIII e 116), também composto de integrantes representando movimentos de pessoas com deficiência, atendendo à globalidade das deficiências, bem como por representantes do Governo Estadual (art. 3.˚, incisos I e II, do Decreto-lei Estadual n.˚40.495/95);

Considerando que São Caetano do Sul, atendendo ao disposto no art. 13, do Decreto Federal n.˚ 3.298/99, criou o Conselho Municipal da Pessoa Portadora de Deficiência (sic), por meio da Lei n.˚4.096, de 22 de outubro de 2002, a qual atribui a função de assessoramento do governo municipal (art. 1.˚);

Considerando, também, que a Lei Municipal supra referida foi alterada pela Lei Municipal n.4.924, de 25 de agosto de 2010, no sentido de estabelecer a paridade na composição do Conselho Municipal da Pessoa Portadora de Deficiência (sic), mantendo-se a função de assessoria (art. 1.˚);

Considerando que assessorar tem o significado de “auxiliar tecnicamente, graças a conhecimentos especializados em dado assunto” , ao passo que deliberar, em contrapartida, significa “decidir, assentar, ...resolver” ;

Considerando que “no grau mais elevado da hierarquia jurídica, encontra-se a Constituição Federal, “à qual todas as demais normas devem subordinar. Todas as disposições que integram o texto da Constituição passam, automaticamente, a constituir normas constitucionais e a ocupar o primeiro plano da hierarquia jurídica. As demais devem conformar-se a suas disposições. É o princípio da ‘constitucionalidade’ , que exige a conformidade de todas as demais normas e atos inferiores: leis complementares, leis ordinárias, medidas provisórias, regulamentos, atos administrativos, atos judiciais, etc., às disposições da Constituição” ;

Considerando que, nesse sentido, a Constituição Federal consagrou o regime democrático, que, por sua vez, requer a participação popular nas questões ligadas à política, sendo uma de suas formas a participação da sociedade civil nos Conselhos de Direitos, dentre eles o da Pessoa com Deficiência;

Considerando que a função deliberativa conferida às outras instâncias dos Conselhos de Direitos, que poderiam ser criadas pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos municípios, integrando sistema descentralizado de defesa dos direitos da pessoa com deficiência (art. 13, do Decreto Federal n.˚ 3.298/99), devem ter poder de deliberação e não apenas de consultoria, como o fez a Lei Municipal n.˚4.096/02 e a que a modificou (Lei n. ˚ 4.924/10);

Considerando que a função de assessoria e não de deliberação dada aos seus integrantes contraria o princípio democrático garantido pela Constituição Federal, na medida em que retira desse órgão colegiado a possibilidade de: a) zelar pela efetiva implantação, implementação, defesa e promoção dos direitos da pessoa com deficiência; b) propor diretrizes, acompanhar planos, políticas e programas nos segmentos da administração local para garantir os direitos e a integração da pessoa com deficiência; c) acompanhar o planejamento e avaliar a execução, mediante relatórios de gestão, das políticas e programas setoriais de educação, saúde, trabalho, assistência social, transporte, cultura, turismo, desporto, lazer, política urbana e outras que objetivem a integração da pessoa com deficiência; d) opinar e acompanhar a elaboração de leis municipais que tratem dos direitos das pessoas com deficiência; e) recomendar o cumprimento e divulgar as leis federais, estaduais e municipais pertinentes aos direitos da pessoa com deficiência; f) propor a elaboração de estudos e pesquisas que objetivem a melhoria da qualidade de vida da pessoa com deficiência; g) propor e incentivar a realização de campanhas visando à prevenção de deficiências e à promoção dos direitos das pessoas com deficiência; h) receber e encaminhar aos órgãos competentes as petições, denúncias e reclamações formuladas por qualquer pessoa ou entidade, quando ocorrer ameaça ou violação de direitos da pessoa com deficiência, assegurados nas leis e na Constituição Federal, exigindo a adoção de medidas efetivas de proteção e reparação; i) convocar Conferências de Direitos da Pessoa com Deficiência, de acordo com o Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência (Diretrizes para Criação de Conselhos Estaduais e Municipais dos Direitos da Pessoa com Deficiência, elaboradas pelo CONADE);

Considerando, ainda, que as Lei Municipais acima referidas, quando da criação do Conselho Municipal da Pessoa com Deficiência, sequer estabeleceram regras de eleição dos representantes da sociedade civil;

Considerando que diante de tal omissão, deveria o Poder Executivo de São Caetano do Sul, quando da formação do primeiro Conselho Municipal das Pessoas com Deficiência, ter seguido as “Diretrizes para a Criação de Conselhos Estaduais e Municipais dos Direitos da Pessoa com Deficiência” fixadas pelo CONADE, segundo as quais os conselheiros, titulares e suplentes, representantes da sociedade civil, deverão ser eleitos durante a I Conferência Municipal dos Direitos da Pessoa com Deficiência, conforme regras publicadas no Edital de convocação dessa Conferência, que também avaliará as políticas públicas de atenção à pessoa com deficiência implantadas no município, assim como aprovará diretrizes para a elaboração, implementação e controle social de tais políticas;

Considerando que esta Promotora de Justiça de São Caetano do Sul, com atribuição de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência, recebeu a representação anexa, dando conta de que a Prefeitura Municipal não cumpriu parte das diretrizes do CONADE, dando posse ao novo Conselho Municipal da Pessoa com Deficiência, sem que tenha aberto o processo de escolha democrática dos integrantes que representam a sociedade civil;

Considerando, ainda, que pela análise da legislação municipal que criou o Conselho Municipal da Pessoa com Deficiência, vislumbro que a sua autonomia pode ser comprometida pela subtração do poder de deliberação por parte das Leis Municipais n.˚4.096/02 e n.˚ 4.924/10,

Instauro o presente INQUÉRITO CIVIL, para averiguar o cumprimento da legislação supra Prefeitura Municipal de São Caetano do Sul, no tocante ao Conselho Municipal da Pessoa com Deficiência.

São Caetano do Sul, 05 de abril de 2011.


Maria Izabel do Amaral Sampaio Castro
8.ª Promotora de Justiça de SCS